François Marie Gabriel Delanne nasceu em Paris, no dia 23/3/1857, ano de lançamento de "O Livro dos Espíritos". Seu pai, Alexandre Delanne, muito amigo de Allan Kardec, era espírita e sua mãe, Marie Alexandrine Didelot, era médium e contribuiu na codificação do Espiritismo. Gabriel foi engenheiro e dedicou-se ao Espiritismo Científico, tendo buscado sua consolidação como uma Ciência estabelecida e complementar às demais. Fundou a União Espírita Francesa, a revista "O Espiritismo", além de ter publicado vários livros. Desencarnou no dia 15/2/1926, aos 69 anos.
Semana 118
O Espiritismo e a Ciência – Parte VII
Edson Ramos de Siqueira
Nicolas Camille Flammarion (1842 – 1925); mais
um baluarte do Espiritismo, também de nacionalidade francesa; como Allan
Kardec, Léon Denis e Gabriel Delanne. Conforme João Sérgio Boschiroli, na obra
“Somos Pequenos Deuses na Terra”, aos quatro anos Flammarion já sabia ler, aos
quatro anos e meio já escrevia e aos cinco adquiriu conhecimentos elementares
de gramática e aritmética. Apaixonado por Astronomia, escreveu, aos 16 anos de
idade, o livro “Cosmogonia Universal”, com 500 páginas. Em seguida, publicou a
obra “O Mundo antes da Aparição dos Homens”.
Em 1862,
com a idade de 20 anos, publicou a “Pluralidade dos Mundos Habitados”, antes de
conhecer o Espiritismo. Nos relata João Sérgio Boschiroli que, certa vez, no final
do ano de 1861, Camille Flammarion folheava publicações numa galeria em Paris
quando, ao abrir uma delas, deparou-se com o título “Pluralidade dos Mundos”,
exatamente na época em que estava a escrever o livro que se referia a este
assunto. A publicação que ele abrira e surpreendera-se era “O Livro dos
Espíritos”, de Allan Kardec. Ele ficou muito intrigado com o fato da origem das
informações ter sido atribuída a Espíritos. Comprou o livro e o leu na íntegra.
Feito isto, procurou Allan Kardec, de quem tornou-se grande amigo, tornou-se
espírita e passou a participar das reuniões da Sociedade Parisiense de Estudos
Espíritas, onde recebeu várias mensagens assinadas por Galileu Galileu, algumas
das quais Kardec incluiu em sua obra “A Gênese”, publicada em 1868.
Flammarion
proferiu o discurso de despedida no enterro do Codificador do Espiritismo, a
quem se referia como “o bom senso encarnado”. Posteriormente, escreveu um grande número de obras, muitas com
a abordagem espírita da pluralidade dos mundos habitados. Em 1870 publicou um
tratado sobre a rotação dos corpos celestes. Em 1882 criou a revista L’Astronomie,
editada até hoje. Em 1883 fundou o Observatório de Juvisy, onde realizou trabalhos
de Astronomia, Climatologia e Meteorologia. Em 1887, fundou a Sociedade Astronômica
da França, em atividade até hoje. D. Pedro II e Alberto Santos Dumont, que foi
astrônomo amador, são membros fundadores.
No
alvorecer do Espiritismo, mais um ícone do meio científico da época, a
contribuir com seus conhecimentos na construção de um dos três pilares de
sustentação da Doutrina: a Ciência.
A seguir,
uma pequena amostra de sua grandiosa obra literária. Transcrevi um trecho do
seu livro “Narrações do Infinito”, publicado pela primeira vez em 1867. Da
quarta capa da obra editada pela FEB em 2019, consta o seguinte: “Laureado
por suas contribuições no campo da Astronomia, Camille Flammarion apresenta, em
Narrações do Infinito, uma síntese das realidades siderais ocultas no firmamento
[...]. Em um diálogo entre mestre e discípulo, o sábio Lúmen, recém
desencarnado, lega a Quoerens suas impressões do Mais-Além: liberto do corpo,
dera início a uma viagem pelos confins do Espaço, constatando, à luz da
Ciência, da lógica e do bom senso, a pluralidade dos mundos habitados, as Leis
Divinas que tudo regem e a beleza transcendental do Universo [...].
Apreciemos
o diálogo entre Quoerens e Lúmen, que contém preciosas sensações do processo
desencarnatório:
Quoerens
– Vós me haveis prometido, ó Lúmen!, fazer a narrativa dessa hora,
estranha entre todas, que se seguiu ao vosso derradeiro suspiro, e descrever de
que modo, por uma Lei Natural, embora muito singular, revistes o passado no
presente e penetrastes um mistério que havia permanecido oculto até hoje.
Lúmen
– Sim, meu velho amigo, vou cumprir a promessa e, graças à
longa correspondência de nossas almas, espero que compreendas esse fenômeno
estranho, conforme o classificastes. Há contemplações cuja força o olhar mortal
não pode suportar. A morte, que me libertou dos frágeis e fatigáveis sentidos do
corpo, ainda não vos tocou com a sua mão emancipadora. Pertenceis ao mundo dos
vivos [...]. Não vos admireis, pois, no instante de vos associar ao
conhecimento do meu mistério, do convite para que vos isoleis, mais ainda, dos
ruídos exteriores e me presteis toda a intensidade de atenção de que o vosso
Espírito seja capaz de concentrar nele próprio [...].
Por
onde desejais que eu comece a narração?
Quoerens
– Se bem recordardes, a partir do momento em que, mãos
trêmulas, eu vos fechei os olhos [...].
Lúmen –
Oh!
a separação do princípio pensante e do organismo nervoso não deixa na alma
nenhuma espécie de recordação. É como se as impressões do cérebro, que
constituem a harmonia da memória, se apagassem inteiramente e fossem logo
restabelecidas sob outro modo. A primeira sensação de identidade que se
experimenta depois da morte assemelha-se à que se sente ao despertar, durante a
vida, quando, acordando pouco a pouco, à consciência da manhã, ainda se está
pensando pelas visões da noite. Chamado pelo futuro e pelo passado, o Espírito
busca, por seu turno, retomar a plena posse de si mesmo e deter as impressões
fugitivas do sonho esvaecido, que passam ainda nele com o respectivo cortejo de
quadros e acontecimentos. Às vezes, absorvido em tal retrospecção de um sonho
cativante, sente sob as pálpebras, que de novo se fecham, os elos tênues da
visão reatados e o espetáculo prosseguir. Recai, então, no sonho e numa espécie
de meio-sono. Assim se balança nossa faculdade pensante ao sair desta vida,
entre uma realidade que não compreende ainda e um sonho não desaparecido
completamente. As mais diversas impressões se amalgamam e confundem, e se, sob
o peso de sentimentos perecedouros, tem saudades da Terra de onde vem exilado,
é então oprimida por um sentimento de tristeza indefinível que pesa sobre
nossos pensamentos, nos envolve de trevas e retarda a clarividência.
Quoerens
– Experimentastes essas sensações imediatamente após a morte?
Lúmen
– Após a morte? Mas não existe morte. O fato que designais
sob tal nome, a separação do corpo e da alma, não se efetua – por assim dizer –
sob uma forma dita material, comparável à separação química de elementos
dissociados que se observa no mundo físico. Não se percebe essa separação
definitiva, que vos parece tão cruel, mais do que a pode perceber o
recém-nascido, saindo do ventre materno. Somos verdadeiramente nascidos para a
vida celeste, tal qual o fomos para a existência terrestre. Apenas, não estando
a alma envolta nas faixas corporais que a revestem na Terra, adquire ela mais
prontamente a noção do seu estado e da sua personalidade. Tal faculdade de
percepção varia, todavia – essencialmente -, de uma para outra alma. Há as que,
durante o viver, nunca se elevaram rumo ao Céu, nem sentiram o desejo de
penetrar as Leis da Criação. Essas, dominadas ainda pelos apetites corporais,
permanecem longo tempo em estado de perturbação e de inconsciência. Outras
existem, felizmente, que, desde esta vida, voaram com as suas inspirações
aladas rumo aos cimos do belo eterno. Estas veem chegar com calma e serenidade
o instante da separação: elas sabem que o progresso é a lei da existência, que
entraram no Além, numa vida superior à de aquém. Seguem, passo a passo, a
letargia que sobe ao coração e, quando o último movimento, vagaroso e
insensível, para em seu curso, elas estão já acima do corpo e daí já observaram
o adormecimento. Libertando-se dos liames magnéticos, sentem-se rapidamente
arrebatadas por uma força desconhecida rumo ao ponto da Criação, a que as suas
aspirações, sentimentos e esperanças as atraem.
Observações:
1)
Continuarei a publicar parte deste diálogo na
semana 121.
2)
As partes I, II, III, IV, V e VI deste artigo
estão publicadas nas semanas 102, 103, 106, 109, 112 e 115, respectivamente.
3)
A parte VIII será publicada no dia 9/4/22.