François Marie Gabriel Delanne nasceu em Paris, no dia 23/3/1857, ano de lançamento de "O Livro dos Espíritos". Seu pai, Alexandre Delanne, muito amigo de Allan Kardec, era espírita e sua mãe, Marie Alexandrine Didelot, era médium e contribuiu na codificação do Espiritismo. Gabriel foi engenheiro e dedicou-se ao Espiritismo Científico, tendo buscado sua consolidação como uma Ciência estabelecida e complementar às demais. Fundou a União Espírita Francesa, a revista "O Espiritismo", além de ter publicado vários livros. Desencarnou no dia 15/2/1926, aos 69 anos.
Semana 184
Imperialismo religioso e Evangelização
Martha Triandafelides Capelotto
Não precisamos aguçar muito os nossos sentidos para percebermos que o
orgulho e o egoísmo, seu filho dileto, são ainda os grandes entraves para que
as relações humanas possam atingir um estado de consciência à luz dos deveres
mais comezinhos, mais insignificantes. Claro, não descartamos aqui, movimentos
de alguns para que a realidade global possa se modificar.
As raças, os povos e os
grupos de indivíduos estão sempre disputando primazia e, no campo religioso,
nada é diferente. O que precisamos urgentemente fazer é libertarmos, do
imperialismo, a religião.
O que significa libertar a religião do imperialismo? Significa que já não
podemos mais impor crenças, e sim, convidar a todos ao uso da razão para o
fortalecimento da fé, libertando-nos das ideias fantasiosas a respeito da
Divindade, que nos levam a posturas de inércia quanto à nossa melhora interior
e de comprometimento, igualmente, com o nosso próximo.
Em nos reportando ao Cristianismo, sem desprezar outras correntes
religiosas que também devem cumprir seus papeis, Jesus não impôs crenças, pelo
contrário, nos deixou um roteiro de recomendações valiosíssimas que estamos
distorcendo desde sempre. Exemplos: “Buscai em primeiro lugar o reino de
Deus e a sua justiça; tudo o mais será dado por acréscimo”. Os homens,
invertendo este preceito, fazem exatamente o contrário; buscam tudo o mais, e
esperam que o reino de Deus lhes seja dado por acréscimo à última hora. “Não
faças a outrem o que não desejas que os outros te façam.” “Faze aos outros o
que desejas que os outros te façam.” Também aqui é notório o desacordo com
a justiça simbolizada no primeiro preceito, e com a misericórdia instituída no
segundo. Se procurarmos as causas das desavenças entre indivíduos e nações,
desde as mais simples até as mais graves, como as guerras sanguinolentas que
têm empapado a Terra de sangue e de lágrimas, haveremos de encontrar na
desobediência aos preceitos acima, a inversão total a tão sábias recomendações.
Desse modo, para um novo paradigma de comportamento religioso, necessário
se faz que entendamos que evangelizar é dar, é repartir com o próximo a
alegria, a paz, a vida que encontramos no Cristo; é abdicarmos do “nós”, da
“nossa raça”, “da minha igreja”, do “meu centro”, e etc., pois o espírito
cristão é abnegado. Os ódios, as cizânias, os sentimentos de superioridade
individual, social e racial são a antítese do Cristianismo.
Li certa feita em uma obra espírita uma frase que marcou: “Jesus não
nos veio livrar do inferno: veio tirar o inferno de dentro de nós. Não veio tão
pouco buscar-nos para o céu: veio colocar o céu dentro de nós”. Não estamos
mais na época das teorias, mas, dos fatos. A religião não escapa à exigência da
época, e o Cristianismo de muitos está apenas na mente, não chega ao coração.
Em matéria de moral evangélica a questão não é de rotulagem, nem de
aparências, é de fato. A cruz do Cristo, na vida humana, é um fato concreto e
positivo em toda a força da expressão. A autoridade moral como a Dele, só se
alcança renunciando ao falso poder, à falsa glória, à falsa autoridade, à falsa
riqueza e ao falso saber do século presente.
Assim, não pode haver progresso integral sem renúncia.
A obra de aperfeiçoamento de nosso Espírito é urdida de renúncias sob
aspectos multiformes. Não há caráter consolidado que não se funde numa série de
renúncias, pois renunciar é vencer, vencer é viver. A redenção é impraticável
fora da órbita das renúncias: só nesse ambiente o Espírito conquista a
liberdade e firma o seu império.
O apóstolo Paulo aconselha em sua epístola aos Romanos: “Rogo-vos,
irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um
sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, pois em tal importa o culto
racional; e não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela
renovação da vossa mente, para que proveis qual é a boa, agradável e perfeita
vontade de Deus”. Para que o nosso corpo seja um sacrifício vivo em
oferenda perpétua, é indispensável manter aceso o fogo da renúncia na imolação
do instinto e da cobiça.