François Marie Gabriel Delanne nasceu em Paris, no dia 23/3/1857, ano de lançamento de "O Livro dos Espíritos". Seu pai, Alexandre Delanne, muito amigo de Allan Kardec, era espírita e sua mãe, Marie Alexandrine Didelot, era médium e contribuiu na codificação do Espiritismo. Gabriel foi engenheiro e dedicou-se ao Espiritismo Científico, tendo buscado sua consolidação como uma Ciência estabelecida e complementar às demais. Fundou a União Espírita Francesa, a revista "O Espiritismo", além de ter publicado vários livros. Desencarnou no dia 15/2/1926, aos 69 anos.
Semana 240
ALFABETIZAÇÃO AFETIVA
Sonia Hoffmann
A comunicação, por qualquer forma de linguagem, é um meio fundamental para alguém conhecer os pensamentos e sentimentos alheios e informar sobre os nossos. Muitas vezes, entretanto, não temos consciência suficiente do poder que tanto as palavras quanto a linguagem corporal têm para construir uma interação saudável, sem ocasionar conflitos, estrondos, ruídos, que até podem gerar o afastamento ou a exclusão nos relacionamentos porque não compreendemos ou não somos compreendidos.
Sendo assim, mesmo porque cada ser humano é um universo emocional a ser decifrado, torna-se essencial estabelecer uma comunicação de qualidade, a qual somente poderá ser obtida se tivermos adequado aprendizado e entendimento sobre os sentimentos e as emoções que circulam na intimidade e entre as pessoas. Contudo, como refere Jaume Soler e María Conangla, (2011) "não é nada fácil encontrar a palavra certa, sobretudo quando nos movimentamos no âmbito emocional. Nosso pensamento é veloz e se move em muitas direções ao mesmo tempo" (p. 33).
Se o encontro de palavras é difícil em determinadas ocasiões, a interpretação de sinais corporais e fisionômicos também pode causar enganos ou dificuldades, levando em algumas circunstâncias a uma indiferença justamente por não se saber fazer a leitura necessária, formalizando um conjunto de reações e comportamentos (in)desejados ou (in)adaptativos.
O homem e a mulher, como menciona Joanna de Ângelis (2013), "pela sua estrutura evolutiva, são, essencialmente, seres emocionais. Recém-saídos do instinto, em processo de conscientização, demoram-se no trânsito entre o primarismo – a sensação – e a razão, passando pela emoção. Mesmo quando adquirem o senso do discernimento após se intelectualizarem, acreditando possuir um grande controle da emoção, dela não se libertam como a princípio gostariam. A emoção bem direcionada torna-se um dínamo gerador de estímulos e forças para realizações expressivas, promovendo aqueles que a comandam, como pode fazer-se instrumento de desgraça, caso lhes fuja ao controle. Nos relacionamentos interpessoais a emoção exerce um papel relevante, essencial para o êxito, contribuindo para a afetividade, a convivência feliz. No entanto, antes de se exteriorizar como seria ideal, exige todo um curso disciplinante, uma análise profunda, a fim de converter-se em equipamento adequado do Eu superior, expressando-se na conduta e na vivência. Inicialmente, cada indivíduo deve realizar uma avaliação a respeito da própria emotividade, para identificar se a mesma se encontra embotada, exaltada, indiferente, apaixonada ou sob estímulos enobrecedores. Quando está embotada, não registra as manifestações da afetividade, conforme se expresse, buscando apenas a fonte das sensações rudes, em cujo desbordar se compraz; se se apresenta exaltada, perde a diretriz do comportamento, deturpando quaisquer manifestações de carinho e perturbando o discernimento; quando indiferente, ignora o rumo das exteriorizações, morrendo por efeito de satisfações não saciadas e de prazeres não fruídos; se apaixonada, manifesta-se a um passo da alucinação, porque mantendo os remanescentes dos instintos fisiológicos, deixando que predominem os desejos hedonistas, em egocentrismo infeliz; somente quando estimulada pelos objetivos enobrecedores, estabelece paradigmas e patamares de autorrealização e integração nos mecanismos da Vida. Nessa natural escalada para os níveis da consciência lúcida ou de transcendência do ego, a caminho da conquista cósmica através das suas diferentes etapas, é justo examinar-se: a) como se reage diante de si próprio; b) qual a conduta em referência ao próximo; c) de que forma desenvolver os valores íntimos em relação a si e aos demais" (p. 38-39).
As palavras e gestos, componentes da linguagem, podem ser fonte de comunicação tanto de condutas afetivas por outro ser humano quanto servir de disfarce ou proteção para o mundo interior não ser descoberto. Tudo relaciona-se com a destreza e habilidade para cada ser acessar as devidas leituras e adotar atitude fraterna e compreensiva na medida de cada momento familiar e social. Quase sempre, porém, relacionamentos e condutas se tornam um intrincamento de divagações, confusão e desatenção por conta de nosso analfabetismo emocional, consequentemente incompetência para o reconhecimento da dinâmica de emoções e sentimentos, pois em nossa casa, escola e mesmo na instituição espírita, em poucas ocasiões recebemos ou conversamos sobre a dinâmica deste conteúdo emocional, sendo negligenciada a sua importância necessária e ficamos sem uma aprendizagem tão significativa.
Todos estamos em um processo evolutivo, de ampliação dos valores morais e intelectuais. Se não priorizarmos o que é realmente importante e significativo, ficamos enredados e nos movimentando como em areia movediça, tornando o processo evolutivo mais lento e até custoso. Para Daniel Goleman (2011), no entanto, existe um caminho seguro a ser seguido: a alfabetização emocional. Para ele, "o movimento de alfabetização emocional, porém, vira pelo avesso a expressão educação afetiva - a em vez de utilizar o afeto como um meio para a aprendizagem, ensina o afeto em si".
Os fenômenos afetivos nascem no indivíduo a partir de determinados estímulos internos (pensamentos, lembranças, por exemplo), mas também surgem a partir de estímulos externos que precisam ser considerados (conduta de outros, situações estressantes...). Fundamentalmente, porém, emoções e sentimentos informam e fornecem dados muito importantes sobre como cada ser conduz seu projeto de vida. Uma tradução (in)correta destas informações pode reduzir ou ampliar nossa própria qualidade de vida e as interações realizadas no dia a dia. "Nosso mundo emocional é muito rico de paisagens e tonalidades. Nele convivem, ao mesmo tempo, muitos sentimentos que se sobrepõem uns aos outros ou se potencializam mutuamente: são os códigos que devemos saber decifrar para viver melhor e com mais harmonia". [...] "Todos os sentimentos têm sua razão de ser. Sempre nos proporcionam informações significativas, e a questão reside no que resolvemos fazer com elas. A variedade emocional é importante, e é fundamental saber aceitar e se integrar à paisagem que a cada momento nos cabe viver. Em todo caso, é preciso procurar os ambientes mais favoráveis e colocar em jogo nossos recursos e mecanismos de adaptação a fim de que nossos sentimentos trabalhem a nosso favor. Uma pessoa sente, e aquilo de bom ou de ruim que acontecer em seguida dependerá, em grande parte, da habilidade para reconhecer, traduzir e administrar as emoções, e do fato de ficar ancorado nelas ou de saber se desprender e canalizá-las. Os sentimentos podem ser considerados desadaptativos quando provocam mais sofrimento e criam obstáculos para a realização de nossos projetos de vida; afastam as pessoas de nosso lado e têm efeitos destrutivos sobre nossa personalidade; surgem em momentos inadequados, promovem um modelo desumanizado de indivíduo e atentam contra a solidariedade global.", como
assinalam Soler e Conangla (2011, p. 51).
Logo, o tema emoções e sentimentos precisa urgentemente ser impulsionado em nossos estudos, conversas e palestras, a fim de cada vez mais nos apropriarmos e saber lidar individual e coletivamente com nossa essência, entender as manifestações das demais pessoas e nos conectar com as Leis Morais a partir de um panorama racional, sem atribuir aos conteúdos afetivos a designação de adversários e sim de valiosos amigos para a constituição plena do ser.
Referências
ÂNGELIS, Joanna de (Espírito). Autodescobrimento: uma busca interior. Psicografia de Divaldo P. Franco. Salvador: Leal, 2013. Série Psicológica Joanna de Ângelis, v. 6.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011. [recurso eletrônico].
SOLER, Jaume; CONANGLA, Maria Mercé. Ecologia emocional. Rio de Janeiro: Best Seller, 2011.