François Marie Gabriel Delanne nasceu em Paris, no dia 23/3/1857, ano de lançamento de "O Livro dos Espíritos". Seu pai, Alexandre Delanne, muito amigo de Allan Kardec, era espírita e sua mãe, Marie Alexandrine Didelot, era médium e contribuiu na codificação do Espiritismo. Gabriel foi engenheiro e dedicou-se ao Espiritismo Científico, tendo buscado sua consolidação como uma Ciência estabelecida e complementar às demais. Fundou a União Espírita Francesa, a revista "O Espiritismo", além de ter publicado vários livros. Desencarnou no dia 15/2/1926, aos 69 anos.
Semana 46
Agradar a Gregos e Troianos
Martha Triandafelides Capelotto
Hammed,
autor espiritual de várias obras importantes, destaca em "La Fontaine e o
Comportamento Humano", em se referindo ao título acima, que "A gênese
do insucesso é a atitude de querer agradar a todos". Essa postura mental
resulta da crença fundamentada na perfeição e pode nos levar diretamente à
decepção, à adversidade e ao revés."
Se
tivéssemos espaço, narraria na íntegra a fantástica fábula do "O Moleiro,
o Menino e o Burro", mas sintetizo parte dela: Um Moleiro (pessoa que trabalha em moinho de
cereais) e um menino se dirigem ao
mercado para tentar vender um burro e, ao longo do caminho, em razão dos
comentários que iam ouvindo, iam alternando as posições: ora o moleiro em cima
do animal; ora o menino; ora os dois sendo carregados pelo burro; ora os dois
puxando o animal, tentando acertar de acordo com cada comentário ouvido. Como
não conseguiam acertar diante de cada opinião, acabou o moleiro dizendo:
_certamente, como um burro eu agi, mas daqui para a frente farei como achar
bom, sem escutar ninguém.
Assim,
querer agradar a todos é algo irrealizável, já que os paradigmas são moldados
por sua vez, em condutas perfeitas e padrões impecáveis, criados por pontos de
vista diferentes, juízos relativos e às mais diversas controvérsias. Trocando
em miúdos, sujeitar os outros às suas verdades, às suas opiniões, fazendo
parecer que tudo o que externam traduz-se em algo a ser observado por todos.
É
bem verdade que precisamos ser acolhidos pelo calor humano, pela estima das
pessoas, mas daí, a passarmos várias horas do dia preocupados com a aprovação
ou reprovação alheias, é submetermo-nos a um processo doentio de viver. Quando
percebermos que a dualidade existe, ou seja, a ordem e a desordem, a construção
e a destruição, harmonia e desarmonia, convivem juntas, podemos ser amados ou
odiados, aceitos ou rejeitados, compreendidos ou incompreendidos, e por essa
razão, gozaremos de uma maior leveza quanto a não nos preocuparmos em
acertarmos sempre ou satisfazer a todos.
Agradar
a gregos e a troianos ao mesmo tempo é tarefa impossível.
A
fábula ilustra um preceito que demonstra a necessidade de acreditarmos em nosso
julgamento interno, e que, independentemente do que fizermos, sempre haverá
alguém que discordará de nossas ações ou das nossas condutas, do mesmo modo que
podemos aprovar ou não as ideias alheias, significando tão somente, respeitar e
aceitar a alteridade, a distinção que há e sempre haverá nos relacionamentos
interpessoais.
Em
termos espiritualistas, também se aplica essa fábula, como podemos depreender,
em o Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo 13, item 3, Boa Nova Editora,
..."É preciso, numa palavra, colocar-se acima da Humanidade, para
renunciar à satisfação que proporciona o testemunho dos homens e esperar a
aprovação de Deus. Aquele que estima a aprovação dos homens mais do que a de
Deus prova que tem mais fé nos homens do que em Deus".
Desse
modo, acertar ou errar, sucesso ou insucesso, agradar ou desagradar, pouco
importa, o relevante é estarmos na luta, enfrentando os embates da vida rumo à
nossa melhora espiritual, moral e ética.
Como
sempre, lembrar: estamos a caminho, desenvolvendo paulatinamente o nosso
discernimento em busca de uma coerência existencial, ou seja, a habilidade de
distinguir os valores éticos e estéticos para formar uma opinião pessoal não
influenciada pela razão comum. É a capacidade de não adotar como verdade
absoluta o ponto de vista da maioria, e sim, construir o próprio pensamento
sobre as coisas através da reflexão e avaliação de evidências.
Concluímos com a moral da história: "Não se pode agradar a todos,
mas uma coisa é certa: ao tomarmos decisões, ou recuamos diante da crítica e
começamos tudo de novo, ou desobrigamo-nos abertamente da aprovação alheia e
seguimos em frente, compreenda quem quiser compreender, doa a quem doer. É
impossível contentar a todos. Se fizermos ou deixarmos de fazer, sempre
existirá alguém que fará uso da ironia e de expressões de duplo sentido, ou
seja, utilizará as "cantigas de escárnio e maldizer" (gênero de
poesia da idade média), cujo objeto da sátira será sempre a pessoa que se
queira difamar.