François Marie Gabriel Delanne nasceu em Paris, no dia 23/3/1857, ano de lançamento de "O Livro dos Espíritos". Seu pai, Alexandre Delanne, muito amigo de Allan Kardec, era espírita e sua mãe, Marie Alexandrine Didelot, era médium e contribuiu na codificação do Espiritismo. Gabriel foi engenheiro e dedicou-se ao Espiritismo Científico, tendo buscado sua consolidação como uma Ciência estabelecida e complementar às demais. Fundou a União Espírita Francesa, a revista "O Espiritismo", além de ter publicado vários livros. Desencarnou no dia 15/2/1926, aos 69 anos.
Semana 97
O CARÁTER INCLUSIVO
DA ÁREA DE ESTUDO DO ESPIRITISMO
IDE E EVANGELIZAI TODAS AS CRIATURAS
Sonia Hoffmann
Dar início a uma
palestra com este título, sem antes abordar como foi o ministério de Jesus
durante sua passagem entre nós, é o mesmo que falar sobre o significado de
nossas vidas no espaço sideral sem conhecer os elementos que nele podemos
encontrar.
Toda a proposta de
Jesus no ensino e divulgação da Boa Nova aconteceu a partir de uma série de
ressignificações e rompimentos de preconceitos, medos, barreiras atitudinais e
de práticas já sem sentido para o ingresso de cada um na nova era de amor e
inclusão para a qual ele veio nos despertar e convidar.
Desde o momento que introduziu os
objetivos da sua presença entre nós, Jesus não apenas falou sobre o amor, a
compaixão, a caridade e tantos outros preceitos morais necessários a evolução
da humanidade. Ele saiu do discurso e exerceu com naturalidade e espontaneidade
a prática pela vivência constante da fraternidade, do protagonismo e da
valorização ampla e profunda dos direitos humanos e da diferença nos seus mais
variados aspectos.
Jesus organizou
equipes de trabalhadores com peculiaridades diversas desde a procedência, a
estatura, a idade, os conhecimentos; interagiu com pessoas de todas as classes
sociais e financeiras; deu visibilidade tanto ao homem quanto à mulher, à
criança e ao idoso; usou tanto da firmeza quanto da docilidade; falou de modo
simples quando necessário e, por estratégia pedagógica, também utilizou o simbólico
quando sua intenção era trazer alguém pela meditação para a mudança de
comportamento, de atitude, de um repensar; foi do simples ao complexo e do
complexo ao simples.
Jesus falou,
perguntou, ouviu, se envolveu, dialogou, utilizou as mais variadas estratégias,
mantendo a essência do esclarecimento. Quando resgata os ensinamentos
organizados no Antigo Testamento, ele promove o que hoje apresentamos como
encontros inversos ou aula invertida, porque traz aquilo que
já foi estudado para uma nova abordagem e discussão.
Até mesmo durante
sua crucificação, ele pedagogicamente fala em voz audível: Pai, perdoa, porque
eles não sabem o que fazem.
Sendo a conexão com
Deus intensa, será que ele precisava falar em voz alta isto? Sim, ele assim o
fez para que cada um que lá estava pensasse naquilo que não sabia, nas suas
vulnerabilidades, nas suas incompetências humanitárias.
Enfim, Jesus, mesmo
após sua crucificação, traz novos ensinamentos por vias de uma didática
extremamente eficiente e estratégias pedagógicas, culminando com sua última
conclamação aos quinhentos da Galileia (como é apresentado no livro Boa Nova,
pelo Irmão X) ou, como brilhantemente menciona Amélia Rodrigues, aos semeadores
galileus: Ide e evangelizai todas as criaturas, ide e evangelizai todas as
gentes.
A reflexão sobre
estas duas referências (500 da Galileia e semeadores galileus) é importante ser
feita, porque aqui é retirada a ideia de quantificação e valoriza a proposta de
qualificação, remetendo para outro ensinamento de Jesus contido na parábola do
semeador.
Jesus
evangelizou, foi e é o modelo de inclusão. Como modelo includente e inclusivo,
nos mostrou e provou haver possibilidades de alcançar e evangelizar, levando a
mensagem evangélica e doutrinária a todas as gentes. O que nos impede de fazer
isto? saber quem são todas as gentes? como falar a todas as gentes nas suas
peculiaridades?
Jesus nos mostrou!
Todas as gentes são todas as gentes e nós insistimos que inclusão é processo
novo e voltado somente para pessoas com deficiência, quando na verdade, é algo
que tem direção e sentido para quem está ou sente-se excluído. Quem assim se
encontra, quer e pede por inclusão!
O princípio filosófico
de inclusão está na justiça, na equidade, no caráter indissociável de
deficiência e diferença. Para alcançar a todos é preciso atitude, ou seja, ação
acessível. Qual foi a atitude acessível de Jesus? O diálogo, a aproximação, o
despertamento para o protagonismo pela reflexão, pela coerência, falando um sim
sim ou um não não, sem conivências, falsos sentimentos, sem destilar
preconceitos nas suas mais variadas formas que vão desde o racismo, a
xenofobia, a homofobia, o capacitismo.
A riqueza e a
valorização da vida estão na diversidade, na condição de todos serem diferentes
e cada um tenha algo para ensinar, para aprender, para trocar. Nos abrir para
esse mundo novo repleto de vivências e experiências diversas, altruístas e
reconhecimento das diferenças, que é a alteridade, consiste o nosso grande
desafio, um desafio que não está no outro, mas em nós: o desafio de conviver
bem e sadiamente com a singularidade e peculiaridade alheia, o desafio de não
querer adaptar esta diferença à nossa visão pessoal, o desafio de não engessar
em nossos padrões, o desafio de não modelar alguém aos nossos valores.
O desenvolvimento e a agilização de uma
ação de responsabilidade social mais comprometida moralmente são então urgentes
e necessários para interagirmos com mais eficiência e eficácia com as demandas
das sociedades deste milênio, porque as dores ocultas, imperceptíveis e não
ostensivas causam mais prejuízos, destruição e são bem mais agravantes do que
aquelas visíveis, palpáveis, perceptíveis. A invisibilidade causa muito mais
danos do que possamos pensar.
Por isto, é
preponderante e indispensável a agilização e presença contínua/continuada da
ação inclusiva e evangelizadora dos e pelos líderes/trabalhadores desde estes
tempos de transição para a nova era.
Os componentes
inclusivos, na perspectiva da aprendizagem doutrinária são: cooperação,
empatia, objetividade, clareza, contextualização, equidade, alteridade e,
especialmente, o diálogo.
Dirigentes,
coordenadores, facilitadores de cursos e trabalhadores nas variadas estruturas
da instituição espírita, que desejam participar efetivamente do panorama
inclusivo característico do tempo regenerativo, terão de meditar, ponderar e
desenvolver uma atitude de relação parceira, protagonista com a diferença, lembrando
sempre que diferença, tal como inclusão, não se refere única e exclusivamente à
deficiência: inclusão e diferença dizem respeito a todos
que por suas características estão ou sentem-se excluídos.
Como encontramos em
O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo III, item 17: nos mundos
regenerativos "Em todas as frontes vê-se escrita a palavra amor; perfeita
equidade preside as relações sociais, todos reconhecem Deus e tentam caminhar
para Ele, cumprindo-lhe as leis."
Contudo, podemos
começar e agilizar este processo desde este mundo de provas e expiações.
Inclusão e ensino
doutrinário é o movimento de trocas incessantes, contínuas, que oportuniza
constante crescimento mútuo, o qual é regulado pela solidariedade, fraternidade
e pela lei de justiça. Nesta troca, surge o desejo de aprender, ensinar e
crescer sem as barreiras impostas pelo orgulho e pelo egoísmo, as duas
principais chagas da sociedade humana.
Na relação
inclusiva, não há espaço para constituição de pedestais ou pódios de arrogância
e superioridade; nem existe espaço para a consolidação de porões que isolam
alguém na menos-valia, desvalorização e acomodação.
O processo
includente é construtivo, dinâmico, com permuta frequente na qual quem tem algo
(seja uma informação, uma atitude, uma dúvida) oferece, quem precisa (seja o
auxílio, a informação, o incentivo) recebe. Ambos, porém, se reconhecem e se
necessitam na completude, sem que os papéis caracterizem ou definam
inferioridade ou superioridade de qualquer um que tenha dado ou recebido.
Este intercâmbio
estimula e favorece a troca de diferentes experiências, percepções e
entendimentos, conduzindo para uma maturidade que é capaz de romper, sobrepujar
e libertar de estigmas, intolerâncias, desníveis e intoxicações que nada de bom
e saudável acrescentam e somente fomentam uma impiedosa e maldosa
marginalização, encarceramento e consequente exclusão.
A metodologia do
ensino doutrinário, na perspectiva inclusiva, precisa ser solidária, dialógica,
coerente, orientadora, clara e utilizando estratégias de acessibilidades
fundadas nos princípios da autonomia, conforto e segurança tal como Jesus
exemplificou ao longo do seu Ministério. Jamais adotando o autoritarismo, o
distanciamento e o encaixe, ou seja, sem que aquele que chega com a sua
diferença (deficiência ou não) tenha sempre de se moldar ao já existente;
porque é preciso desenvolver a lógica da contextualização, da possibilidade, da
reciprocidade, da flexibilização no desenvolvimento da reflexão, para que não
só a fé se torne raciocinada, mas também a atitude se desenvolva em um cenário
de compreensão e de valorização das diferenças e diversidade de aptidões.
Nesse clima de
parceria acontece o desenvolvimento de todos, a formalização de equipe ativa e
participativa, estimulada. A aprendizagem, a partir desta metodologia, tira o
foco dos contrários serem adversários ou inapropriados. Não existe uma solução
ementária ou uma tentativa de tornar o diferente normalizado, e sim produtivo,
participativo e habilidoso.
Inclusão, que não
dissocia deficiência de diferença, entende as diferenças de alguém como
possibilidades, como qualidades do que esta pessoa é em sua essência e sua
vivência, retirando desta diferença o nosso hábito rançoso de perceber a
deficiência e a diferença como motivo para exclusão, pelo entendimento dela
reduzir alguém diferente como imperfeito, problemático, com
defeito.
Por essas razões, precisamos:
1. cooperar, pelo
protagonismo, para a melhoria, aprimoramento e conquista da melhor performance
dentro da possibilidade de alguém;
2. evitar a redução de
alguém às características da sua diferença;
3. incentivar o
desenvolvimento de potencialidades e o surgimento de habilidades;
4. procurar gerenciar
distâncias adequadamente na interação, sem aproximações excessivas que sufoquem
ou afastamentos demasiados que isolem;
5. reduzir o impulso de
diminuir o esforço ou evidenciar a exposição da vulnerabilidade;
6. suprimir comparações,
julgamentos e recriminações;
7. demonstrar disposição
e disponibilidade para auxílio sincero
8. optar pela inclusão e
não pela integração;
9. valorizar os pontos
fortes e as maneiras apresentadas por alguém na realização, com êxito, de algo
por vias alternativas;
10. oportunizar
atividades factíveis;
11. destacar a importância
e necessidade da (cor)responsabilidade;
12. respeitar os limites
reais de alguém, sem subestimar ou superestimar, sem invasão de privacidade ou
ferir suscetibilidades;
13. conhecer e aplicar os
recursos disponibilizados pela tecnologia assistiva e pelas diversas
estratégias pedagógicas e de acessibilidades (que são os caminhos para a
inclusão);
14. estudar o Evangelho
de Jesus, estudar pelo menos os 1019 esclarecimentos inclusivos que se
encontram em O Livro dos Espíritos dentro da Codificação e informar-se sobre os
artigos relacionados às diferenças, encontrados na Revista Espírita;
15. saber migrar de
fontes confiáveis, que não se encontram somente no Espiritismo, conhecimentos,
informações e alternativas de acessibilidades para a aproximação e construção
conjunta com a diferença;
16. ser capaz de entender
a adversidade, a dor, a diferença e ajudar na transformação da prova ou
expiação em algo que faça sentido ;
17. propor a humanização
do Espírito humano, auxiliando e valorizando o aprendizado e o convívio, desde
o aqui e agora, até alcançar outras dimensões;
18. evitar a rotina na
estruturação e dinâmica dos encontros;
19. adaptar os métodos de ensino à necessidade e ao
interesse do participante, e não o contrário;
20. usar a observação, o
diálogo e a tecnologia para identificar
as necessidades e interesses de cada participante, recomendando a ele conteúdo
personalizado e incentivando seu engajamento grupal;
21. enfim, recordar que é
muito fácil falar difícil, mas é muito difícil falar e agir com simplicidade e
que esta simplicidade se refere à facilidade de decodificação, entendimento, da
mensagem e não ao esvaziamento do conteúdo moral e intelectual desta mensagem.
INCLUSÃO É UM DIREITO E UM DEVER DE
TODO SER QUE DESEJA EVOLUIR
E, EVANGELIZANDO OU
LEVANDO A TODOS A BOA NOVA, SOMOS OS COCONSTRUTORES DA NOVA ERA, OS SEMEADORES
GALILEUS!